OPINIÃO -Agora nós que somos os Tamagotchi?

 






Você se lembra do brinquedinho eletrônico chamado Tamagotchi? Foi uma verdadeira febre entre as crianças na década de 1990. Esse brinquedo era uma espécie de pet virtual, que precisava de cuidados como um pet de verdade. Os donos do pet, no caso crianças e adolescentes, tinham de ‘alimentá-lo’ regularmente, ‘dar banho nele’, ‘brincar com ele’, ‘levá-lo  para passear etc. para que ele pudesse ‘crescer’, ‘se desenvolver’ e, principalmente, continuar ‘vivo’.

Uma ideia divertida, aparentemente inofensiva, gerou muitos problemas, pois as crianças levavam seus pets digitais para a escola, para poderem cuidar dele. Havia o risco de ‘morrerem’  em menos de meio dia, que corresponde ao período de permanência na escola, se não recebessem os cuidados adequados. A morte do Tamagotchi era um acontecimento muito sofrido. As crianças choravam a  sua morte como se fosse de um ente querido real, de carne e osso. Chegavam a ponto de fazer o seu funeral.

A exemplo do que acontece com o acesso ao celular em sala de aula, os professores ficavam incomodados com a interrupção das aulas e com a distração dos alunos, representado pela atenção dedicada ao Tamagotchi. Diante da proibição de irem acompanhados do seu pet virtual na escola, como forma de garantir os cuidados dele, as crianças passaram a delegar esses cuidados para a própria mãe. Mas, e se a mãe descuidasse dele? E se ele morresse nas mãos dela? Seria um drama terrível!

Enquanto o Tamagotchi era um brinquedinho que afetava apenas os hábitos de vida das crianças e adolescentes – uma moda que passou-, a necessidade de cuidar diuturnamente da nossa existência digital agora é uma realidade que veio para ficar. Nos tornamos reféns dos nossos perfis digitais.

Quando criamos uma conta nas mídias sociais, criamos um perfil digital, que precisa ser alimentado continuamente. Não basta ele estar lá para existir, pois ele precisa existir para os outros. Temos que ser vistos, reconhecidos. A indiferença é a morte digital, nossa morte social. Para que continuemos vivos digitalmente, temos que alimentar o nosso perfil com conteúdo novo, a cada dia.  A alimentação diária do nosso perfil digital demanda preparo, pois ele não pode ser alimentado com qualquer coisa. Precisa ter conteúdo. O preparo desse ‘alimento’ toma tempo e requer criatividade. O nosso ‘Tamagotchi’ cresceu e nos escravizou.

Mas, se cuidar do nosso perfil digital nas mídias sociais já demanda muito tempo, como será a gestão do nosso avatar no Metaverso? Será que saberemos cuidar dele? O que acontecerá se descuidarmos dele? Como dar conta disso? A solução é terceirizar, a exemplo das crianças que delegavam para as mães os cuidados do seu pet virtual. Profissionais especializados em gerar conteúdo para as mídias sociais agora são contratados só para isso. 

Nosso perfil nas mídias sociais é nossa vitrine para o mundo, e, como toda vitrine, precisa ser renovada sempre, para que continue atraindo a clientela. O que será de nós se o nosso perfil digital não for alimentado? Deixaremos de existir para um público, muitas vezes desconhecido, ávido em ‘bisbilhotar’ a nossa vida no “Fuçabook” e carente de modelos para adotar? Perderemos oportunidades de negócio? Não conseguiremos emprego? Ficaremos sós? 

Ao criarmos um avatar no Metaverso, uma representação idealizada de nós mesmos,  adquirimos uma identidade no mundo digital. O avatar ocupará o nosso espaço nessa realidade paralela. Em algum momento, essa identidade digital, criada e alimentada diariamente, irá competir com a nossa identidade real, com o nosso ser biopsicossocial, que precisa de alimento, de atividade física, de sono, além de relações sociais significativas para mantermos nossa saúde física e mental.  

Quais os riscos disso? 

A Internet nos aproximou das pessoas, certo? 

Sim... e não! 

Embora estejamos conectados e saibamos o que as pessoas estão fazendo, com a possibilidade de darmos o nosso pitaco nos comentários, perdemos o essencial: a qualidade das relações interpessoais. A digitalização da nossa existência, a contínua criação de conteúdo para mantê-la, está competindo com nossas relações interpessoais reais. Estar conectado virtualmente, digitalmente, não supre nossa necessidade de proximidade física e psicológica. 

Considerando que as necessidades humanas continuam as mesmas, desde os tempos primordiais, como atender às necessidades socioemocionais em meio à revolução tecnológica em curso? A necessidade básica de contato, expressa pela oralidade, que corresponde ao fator Contatos no HumanGuide, deixará de ser atendida? O que dizer da necessidade de vínculo e de segurança, que corresponde ao fator Estabilidade? 

O deslumbramento com as infinitas possibilidades que a realidade digital pode proporcionar pode nos afastar da realidade, enquanto tal. Qual será o nosso destino? Qual será o destino da humanidade? Adoecermos, física e mentalmente! Nos tornaremos seres alienados. Quando cairmos na realidade, estaremos irremediavelmente fora dela.





Comentários

  1. Giselle an interesting point! At first I like that you give it a name Tamagotchi. I like that because it helps your memory to remember it and also talk about it.

    It also brings up many thoughts. One important – always – is the Swedish word LAGOM, i.e. not too much, not to too little – just good enough;-) You need to have in mind: Why are you "profiling" you on internet? If you do it well you gain good relations and gain time, but it could also be a burden... Therefore, you need a strategy, which suits you!

    At first you should BE YOU in a good way, because then you attract people, who have a similar personality and interests as you. Their you have good guidance from your HumanGuide PersonProfile. That is always important to have in mind, because if you let it govern your way in life, then you get a high Passionindex and it contributes to a good life.

    Your personality (drives) is also important in another way – you should figure out the way you nurture your profile, so it is harmony with your personality, i.e. you do what you like to do. Don't copy other people. Do it your way. E.g. I have a high value on Quality (HG language). This means that I like to help people. That combined with my age 7.6 ;-) means that i have a lot of insights and experiences to share. I do and I enjoy;-) But of course that I need to be observant for feedback, so I get a receipt that what I write is appreciated by the right people. The ones I like to have in my network. Some also around my fire;-)

    P.S. But of course real meetings are the best. The highest level is when you have the feeling that time doesn't exist. You have so-called raport. Then your Sensibility (HG) is very happy. But don't forget to write in a personal way on the internet, so you feed Sensibility e.g. in emails now and then personal photos, etc.

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  2. Importante reflexão. Cuidar das relações interpessoais retrata a nossa existência, muito mais importante do que ser visto é estar em contato direto com as pessoas., gerindo nossas emoções e lidando com os desafios que o ato de se relacionar nos impõe. Não devemos abrir mão do estar em contato com o outro.

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