Nosso julgamento e percepção são precisos e confiáveis?

 



Sempre que opinamos sobre algo, emitimos um parecer ou tomamos uma decisão, estamos fazendo um julgamento. Não importa o tema, acreditamos que temos razão. É comum questionarmos a precisão do julgamento do outro, acreditando que o nosso julgamento seja o correto. Entretanto, embora tenhamos uma confiança subjetiva na qualidade do nosso julgamento, isso não garante que ele seja preciso. 


Quando nos deparamos com situações e resultados que nos parecem estranhos, pois não correspondem às nossas expectativas, sentimos necessidade de explicar o que aconteceu. Pistas múltiplas e conflitantes criam ambiguidade, tornando mais difícil fazer um julgamento preciso. Queremos entender e descobrir o que estava por trás do ocorrido. Buscamos um sentido, uma coerência. A busca de coerência no julgamento faz com que, na maioria das vezes, formemos uma opinião precoce, com base em informações e evidências limitadas. É como se criássemos as peças necessárias para completar o quebra-cabeças.


Ao nos sentirmos inseguros sobre o nosso julgamento, frequentemente nos apoiamos nas pessoas que, acreditamos, entendem bem do assunto para verificarmos se o nosso julgamento coincide com o delas. De certa forma, estamos em busca de uma confirmação. O ditado popular “Era bom demais para ser verdade. Era verdade, mas não era bom!”, resume a influência das nossas expectativas sobre o nosso julgamento. Na busca de coerência, inconscientemente, confirmamos nossos preconceitos e expectativas com base numa leitura enviesada das informações disponíveis. 


Você já se perguntou se o seu julgamento é preciso, confiável?  


Você sabia que, quando as diferenças no julgamento ocorrem, invariavelmente, várias fontes de erro estão presentes? Uma delas é bem conhecida por nós: o viés. Trata-se do desvio sistemático, ou tendência, para adotar determinada direção. Vários aspectos, como preconceito estrutural, religião, origem sociocultural e étnica, visão política, cultura organizacional, entre outros, determinam o viés no julgamento. Nosso julgamento também é influenciado pelas diferenças interpessoais, decorrentes das diferentes experiências de vida e do ‘background’ cultural, da visão particular de mundo e, também, da personalidade. 


Se houver mais de uma maneira de enxergar qualquer coisa, as pessoas certamente irão se diferenciar em relação à maneira como a enxergam. 


Uma importante fonte de ruído pode ser encontrada nas diferenças individuais. Somos seres singulares. Sempre que emitimos um julgamento, ele fatalmente virá carregado com nossa bagagem.  Nossos padrões de resposta são bastante estáveis, bastando que determinados gatilhos, muito enraizados em nossa personalidade, sejam ativados para que se manifestem. O padrão de resposta é um reflexo da nossa singularidade, que tem relação direta com nossa personalidade. 


A singularidade da personalidade favorece a inovação e a criatividade das equipes, pois permite que os profissionais com características de personalidade diferentes se complementam por meio de julgamentos distintos. Entretanto, caso o objetivo seja alcançar um julgamento de consenso, a diversidade de traços de personalidade na equipe  pode ser um complicador, pois a consistência no julgamento de cada membro da equipe, com todos os vieses e ruídos inconscientes que lhe são próprios, dificulta o  consenso. O ruído é, portanto, um subproduto da singularidade, de diferentes “personalidades julgadoras”. 


Algumas pessoas são mais propensas a deixar que seus preconceitos afetem seu pensamento e julgamento, enquanto outras são mais suscetíveis a fake News. As pessoas mais receptivas ao julgamento dos outros se deixam influenciar por afirmações aparentemente impressionantes, apresentadas como verdadeiras e significativas, porém vazias de sentido e de significado, quando analisadas com objetividade.



Na política, como no mundo da música, o sucesso depende dos influenciadores, especialmente quando determinadas pessoas são percebidas como atraentes e interessantes,  enquanto outras não repelidas, ou até canceladas. Os ‘influencers’ podem comprometer a precisão do julgamento coletivo por meio da redução da diversidade da percepção e do julgamento do grupo, gerando efeito de manada, um falso consenso, apesar da diversidade que existe entre as pessoas.  


Esse fenômeno também afeta a dinâmica de grupo. Embora a independência de opinião seja um pré-requisito para a sabedoria coletiva, quando as pessoas não julgam por si próprias e se deixam levar pelo que os outros dizem, nos deparamos com outra importante fonte de erro de julgamento: a pressão social.  Quando uma pessoa do grupo goza de muita popularidade  e prestígio, ela faz com que ocorra um movimento de aceitação por parte dos outros, favorecendo a manipulação ou enviesamento do resultado das discussões. Eventualmente,  uma proposta diferente, apresentada por outra pessoa do grupo, que tenha recebido pouco apoio da pessoa que goza de poder de influência, pode ser rejeitada pelo grupo, independentemente da sua qualidade.


Você já reparou que, nos trabalhos em equipe, depois que a primeira pessoa a falar expressou sua preferência por algo, ou propôs algo, tendemos a concordar com ela? Desde que não tenhamos um motivo especial para desconfiar dela ou para não acreditar nela, nossa tendência á concordar.  Um exemplo disso é o que ocorre nos processos seletivos. Quando não estamos certos sobre quem deveria ser contratado, pode ser uma estratégia inteligente acompanharmos o parecer das outras pessoas ou da chefia. À medida que aumenta o número de pessoas com a mesma visão, confiar nelas pode se tornar uma estratégia ainda mais inteligente. Pode ser que dê certo, mas o aparente consenso no grupo  pode ser resultante do desejo de agradar a maioria, ou de apoiar a primeira pessoa que falou, caso ela tenha um papel importante no grupo.  Dessa maneira, os membros do grupo adicionam sua voz ao consenso, aumentando, assim, a  pressão social sobre aqueles que ainda não externaram sua opinião. Por isso, atenção:  quando alguém estiver especialmente preocupado com a própria reputação dentro do grupo, poderá mudar de opinião e seguir a tendência dominante.


As diferenças de julgamento também podem ser um reflexo de mudanças que ocorrem na própria pessoa, das diferenças intrapessoais. Da mesma maneira como um jogador de futebol nunca chuta a bola duas vezes exatamente da mesma maneira, não produzimos julgamentos idênticos quando nos deparamos com os mesmos fatos, quando passamos por situações e momentos diferentes. Essa fonte de ruído, que afeta a precisão do nosso julgamento, é ocasional, pois decorre de flutuações no nosso estado de ânimo e humor, disposição física, fatos ocorridos antes etc. Entretanto, estar de bom humor nem sempre é algo positivo, pois até o mau humor pode ter um lado positivo. Pessoas de bom humor tendem a ser mais cooperativas e benevolentes e provocam a reciprocidade das pessoas, tendem a ser complacentes, a ‘deixar passar’. Os custos e benefícios dos diferentes estados de humor sempre dependem da situação e do contexto.


Fato é que não somos exatamente a mesma pessoa o tempo todo. À medida que o nosso humor varia,  algo que conseguimos perceber com relativa facilidade, algumas características do nosso mecanismo cognitivo variam junto com ele. Apesar de não percebermos, isso faz com que sejamos menos consistentes ao longo do tempo do que imaginamos, ou queremos acreditar. Isso soa estranho para você? Não se assuste, pois nossa personalidade é relativamente estável. Somos mais parecidos com nós mesmos ontem, do que com qualquer outra pessoa hoje. Embora estejamos sujeitos a muitas influências, nossa essência permanece a mesma.


Conhecer a personalidade dos colaboradores, o que os motiva, contribui não só para o desenvolvimento delas, das equipes e da organização, mas para a qualidade de vida no trabalho. Ações voltadas para a identificação dos ruídos que diminuem a precisão do julgamento e das decisões tomadas pode ser uma boa estratégia. Dispor de recursos confiáveis para apreender a percepção do ambiente corporativo contribui para identificar possíveis fontes de ruído que podem diminuir a precisão do julgamento, favorecendo, assim, a qualidade das decisões. O HumanGuide pode ajudar nesse sentido.  



Comentários

  1. Good to remember! Easier also to be humble in your opinions.

    An example. A very experienced psychologist and also friend said to me during a visit: Rolf, you are mare calm than usual. Hmmm. The truth: I was tired;-)

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