SOB O JUGO DO PERFECCIONISMO








O perfeccionismo é uma característica psicológica e um conjunto de atitudes cada vez mais admirado e desejado em nossa sociedade. Ele envolve a busca implacável por padrões de exigência extremamente elevados e a tendência de criticar duramente a si mesmo e aos outros, quando esses padrões não são atendidos. Aqueles que aspiram à perfeição dão grande importância aos detalhes, buscam constantemente aprimorar suas habilidades e não se contentam com o que não é excelente. No entanto, essa busca incessante pela perfeição tem suas armadilhas e desafios, uma vez que, por definição, a perfeição constitui um objetivo impossível de ser atingido. Se assemelha à visão que temos do arco-íris: parece que ele se afasta à medida que tentamos nos aproximar dele. 


Determinadas características de personalidade podem favorecer o desenvolvimento do perfeccionismo. Considerando as dimensões do HumanGuide, podemos associar o perfeccionismo aos fatores Qualidade e Exposição. Esses fatores referem-se à participação social, seja por meio do senso de propósito, seja por meio do reconhecimento do próprio valor pela sociedade. Eles estão relacionados aos sentidos ético e moral, aos freios do comportamento culpa e vergonha, respectivamente. A acentuação desses aspectos pode favorecer o perfeccionismo voltado contra si mesmo, com o estabelecimento de metas inatingíveis, acentuação da autocrítica e da auto exigência, e se tornar um obstáculo importante para o desempenho. O medo e a vergonha do fracasso favorecem a procrastinação, pois impede que façamos algo ou adiemos o que temos que fazer. A busca da perfeição também pode se tornar um obstáculo para o crescimento e a inovação, pois o novo, portanto desconhecido, não é garantia de sucesso. 


É importante distinguir a busca de qualidade da busca de perfeição, pois muitas vezes são os erros e imperfeições que nos ensinam lições valiosas e nos inspiram a encontrar soluções criativas. Erros e fracassos são, na verdade, tentativas que não deram certo, indicando outros caminhos e formas de lidar com as situações. Thomas Edison é um exemplo disso. O que torna a história dele verdadeiramente inspiradora é a sua resiliência diante dos inúmeros fracassos que enfrentou até conseguir criar a lâmpada elétrica. Nesse processo, ele enfrentou desafios, decepções e obstáculos aparentemente insuperáveis. No entanto, em vez de desistir, Edison enxergou cada revés como uma oportunidade de aprendizado. Sua afirmação de que não falhou, mas que encontrou mil maneiras de como não fazer uma lâmpada ilustra bem isso.


E o perfeccionismo orientado pelas expectativas dos outros, na crença de que nosso ambiente exige perfeição? O culto à imagem de perfeição veiculada nas mídias sociais e a cultura do “sempre mais, maior e melhor” reforçam essa atitude. A busca incessante pela aprovação do outro diante da pressão constante para atingir a perfeição, seja em nossa aparência, corpo, alimentação, família, filhos ou sucesso profissional, faz com que o indivíduo comum sinta que não tem valor. Quando o sucesso é medido na base do tudo ou nada, surge o sentimento de impotência, menos valia, fracasso e vergonha. 


Essa mentalidade crítica, além de impedir que o indivíduo fique satisfeito consigo mesmo, faz com que ele exija muito dos outros, projetando o seu perfeccionismo sobre eles. Cobranças desmedidas e a imposição de um padrão de perfeição impossível de ser atingido tornaram-se muito frequentes no mundo corporativo. Conflitos no relacionamento interpessoal, desmotivação, falta de reconhecimento, medo de perder o emprego, ansiedade, ‘burn-out’, resignação e ‘quiet quitting’ resultam do descompasso entre o nível de exigência e a possibilidade de corresponder a ele.


A combinação do pensamento de déficit, de estarmos em falta, com o sentimento de vergonha, faz com que procuremos esconder nossas dificuldades, limitações e imperfeições, para mantermos uma imagem positiva perante os outros. O sentimento de inadequação e de fracasso compromete nossa autoimagem, autoconceito e autoestima, prejudicando de maneira sorrateira nossa saúde mental. O perfeccionismo pode, portanto, levar a altos níveis de ansiedade e estresse, uma vez que a busca constante pela perfeição é exaustiva, prejudicando nossa qualidade de vida, nossos relacionamentos e nosso bem-estar emocional. Não se trata de menosprezamos a qualidade daquilo que fazemos e as expectativas alheias, mas de equilibrarmos a busca da perfeição com nossas limitações humanas. Podemos ser ambiciosos e nos comprometer a fazer grandes coisas. Mas é importante reconhecer que fazer o melhor dentro das próprias possibilidades e de acordo com um padrão de exigência razoável é uma conduta saudável.


É importante destacar que existem diferentes graus de perfeccionismo, pois nem todos os tipos de perfeccionismo são necessariamente prejudiciais. O perfeccionismo saudável pode envolver a busca por padrões elevados, mas com uma abordagem mais flexível e compassiva em relação a erros e imperfeições, com coragem de compartilhar limitações e dificuldades. No entanto, quando o perfeccionismo se torna extremo e inflexível, pode ser prejudicial à saúde mental e ao bem-estar. Nesses casos, pode ser benéfico procurar ajuda profissional, para aprender a lidar com o perfeccionismo de maneira mais equilibrada. O autoconhecimento e o reconhecimento das próprias possibilidades e limitações permitem que consigamos colocar limites e preservar, minimamente, nossa saúde física e mental. O HumanGuide pode ser um importante aliado nesse processo.


REFERÊNCIAS

Curran, T. (2023). A Armadilha da Perfeição. São Paulo: Companhia das Letras

Welter, G. M. R (2011). HumanGuide Perfil Pessoal - Manual. São Paulo: Vetor Editora Psicopedagógica








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